CPI do tráfico humano investiga desaparecimento de meninas no Amazonas
A CPI vem colher os depoimentos de Bruno Amaral do
Carmo, 27, a Bruna Valadares, que foi vítima da rede de tráfico humano
em São Paulo e apurar o suposto desaparecimento de 20 garotas de
Iranduba.
A Comissão Parlamentar de Inquérito
(CPI) que apura o tráfico nacional e internacional de pessoas
desembarcará em Manaus no dia 10 de dezembro, informou ontem por
telefone a presidente da comissão, a senadora Vanessa Graziottin
(PCdoB/AM). A CPI vem colher os depoimentos de Bruno Amaral do Carmo,
27, a Bruna Valadares, que foi vítima da rede de tráfico humano em São
Paulo e apurar o suposto desaparecimento de 20 garotas de Iranduba,
município no interior do Estado. A audiência pública será realizada na
Assembléia Legislativa do Amazonas (Aleam). É A segunda vez que a CPI
virá a capital amazonense. A primeira ocorreu em julho, deste ano.
“Iremos
averiguar o caso de Iranduba e especialmente o de Bruno Amaral, de
Parintins. Queremos saber como opera a rede do tráfico em São Paulo. Ele
tem muitas informações que irão nos ajudar”, afirmou a senadora.
Acompanharão Vanessa nesta audiência os senadores Marinor Brito
(Psol/PA), relatora da CPI e Paulo Davim (PV/RN). A assessoria da
senadora Vanessa já contatou com travesti parintinense.Bruna deixou
Parintins( a 325 quilômetros de Manaus), em maio, deste ano, epor quatro
meses morou em duas casas da cidade de Jundiaí e de São Paulo, capital.
Neste período, ela foi mantida em cárcere privado, sofreu maus-tratos e
feita escrava sexual. De volta a Ilha Tupinambarana, desde o dia 10 de
novembro, ela diz que vive sob clima de tensão e medo, por conta das
ameaças de morte que recebeu.
Bruno
Amaral do Carmo conseguiu fugir, no final do mês de outubro do ano
passado, dentre um grupo de 20 travestis, que também era explorado pela
rede do tráfico de seres humanos. Em depoimento ao Ministério Público de
São Paulo (MPE/SP), onde ficou sob a proteção da Comissão de Direitos
Humanos da Prefeitura da capital, Bruna relatou que viajou de Parintins
com a promessa de que mudaria de vida, receberia um implante de silicone
e ganharia muito dinheiro. Mas depois de um mês de escravidão ela ainda
descobriu que a clínica das operações plásticas era clandestina e de
propriedade da travesti Eva Touro, chefa da rede criminosa,em São Paulo.
Eva também usa o nome artístico de Boneca Érica, cujo nome civil é
Francisco Evandro.
“Não fiz a
cirurgia porque vi outras `meninas` com muitas sequelas e porque você
acaba se endividando ainda mais”, disse Bruna. Esses procedimentos
consistiam na injeção de silicone industrial nas nádegas, coxas e
quadris das travestis.As traficadas ficavam presas durante o dia e eram
liberadas à noite para os programas sexuais. O apurado era entregue
integralmente a governanta da casa, Priscilla Lapache, travesti que
trabalhava para Eva.
Bruna
Valadaresfoi recrutada, em Parintins, por outra travesti identificada
pelo nome de Marcinha, que reside em Macapá (AP) e que a conheceu no
Festival Folclórico de 2011. Foi Marcinha que intermediou o contato com a
cafetina Eva Touro. Bruna viu o corpo de Marcinha todo transformado e
se deixou levar pelos argumentos da aliciadora. “Quando você chega a São
Paulo já chega devendo para eles e tem que virar escrava sexual para
pagar a dívida, que nunca acaba e só aumenta. Eu cheguei devendo R$ 3
mil, que eram das despesas das passagens, deslocamento e da hospedagem”,
revelou. Bruno chegou a São Paulo pelo aeroporto de Viracopos, em
Campinas, e levada para um casarão no bairro Cabreúva, localizado na
avenida José Donato, entre os números 1550 e 1958, ao lado do “bar da
Preta”, em Jundiaí, no interior paulista. Ela tomou conhecimento, que
naquele mesmo dia, pessoas de outros Estados eram também aguardadas em
São Paulo pelos aliciadores.
Ainda de
acordo com Bruna, a meta do faturamento da noite imposta para os
travestis era de R$ 250. Aqueles que não arrecadavam o esperado eram
espancados e ameaçados de morte. “Quando eles falaram que iriam me matar
comecei a pensar num meio de fugir”. Bruna Valadares e outra travesti
foram transferidas de Jundiaí, para a capital, com o objetivo de
melhorar a renda nos programas. Esta nova casa, segundo o MPE/SP apurou,
esta localizada na rua Vicenza, no Tucuruvi. Lá eram escravizadas mais
20 travestis.
TRES PERGUNTAS PARA BRUNA VALADARES
Como foi a fuga?
A
governanta pediu que eu comprasse um remédio na drogaria. Eu fui e
comprei também um cartão. Liguei do orelhão para o telefone do meu
irmão, em Parintins, que me passou o telefone de um amigo (Fabinho) de
São Paulo. A partir daí com a ajuda do de outro amigo (Demetrius) de São
Paulo e do Dinho (Parintins), que conseguiu mobilizar as autoridades,
voltei a Parintins. Foram três semanas de tentativas, somente em São
Paulo.
Como você conseguiu fugir da casa?
A
governanta percebeu que eu estava nervosa, no dia da fuga. Então ela
mandou que eu saísse da casa dos travestis e me deixou trancada na casa
dela. Eu revirei a casa e consegui encontrar uma chave e saí. Com ajuda
do Fabinho consegui chegar ao aeroporto de Guarulhos, mas perdi o vôo.
Passei dois dias dormindo no aeroporto. Depois o Demetrius me levou para
a casa dele e me deixou na Rodoviária do Tiêtê.
Qual momento você percebeu que sua vida corria perigo?
Em
todos os momentos, principalmente na fuga. Meus amigos que me ajudaram
lá também estavam com muito medo. Eles também poderiam ser mortos. Eu
poderia esta sendo seguida, como fui, na rodoviária. Ainda em Manaus,
antes do embarque de volta a Parintins, eles me passaram uma mensagem
dizendo que eu ia morrer, porque não paguei a dívida de R$ 4 mil.